Los Niños

A cordilheira dos andes é gigante, imponente e nos causa uma sensacao de humildade perante tanta beleza. No entanto, o que mais tem me encantado no Chile é uma cadeia de pequeninas montanhas, mais fortes que a imensa cordillera que engloba a cidade de Santiago.

A mais nova tem 6 anos e no máximo um metro e dez de altura. A mais velha tem 30 e se chama Carolina, ou Cary.

Cary foi quem me esperou por mais de uma hora no aeroporto de santiago, em plena madrugada. É formada em servico social e trabalha gerenciando um orfanato no bairro La Cisterna. O nome simboliza muito bem o que é este lugar, onde agora estou hospedado: "Vida Nueva - Hogar de Niños".

Hogar é um nome muito mais adequado do que simplesmente "orfanato", pois significa lar, abrigo, protecao - e também porque nem todos sao órfaos. Aqui vivem 12 criancas, cujas idades vao de seis a quinze anos, e que pelo esforco e dedicacao da Tia Cary, se tornaram uma verdadeira familia.

O Vida Nueva sobrevive com doacoes de empresas privadas. É sempre uma correria danada para cobrar todos os empresários comprometidos em financiar uma infancia melhor para as criancas. Quando atrasam o pagamento, pode faltar pao. Cary diz que o governo Chileno também poderia ser um financiador, mas que por conta de uma série de exigencias da parte do Estado, prefere nao utilizar dinheiro publico. O governo diz que para utilizar a verba destinada a orfanatos, o hogar nao poderia ser misto e precisaria abrigar pelo menos 30 criancas. Estas medidas tornam impossivel a sua principal missao, que é fazer com que os que ali vivem se sintam parte de uma familia. Com poucas criancas de sexos diferentes, se criam condicoes e situacoes iguais as de uma familia tradicional: é preciso partilhar comida, quartos e brinquedos. Também há brigas, choros e discussoes seguidos de um aperto de maos para fazer as pazes.

Algumas criancas chamam Cary de mae. E Nao é para menos. Dela vem o carinho e o amor que nao existiu por parte dos pais biologicos dos meninos e meninas, pelos motivos mais sórdidos que se possa imaginar.




No aviao que peguei de Guarulhos para Santiago, sentou ao meu lado Marcela Rodriguez, uma psiquiatra chilena de descendencia mapuche. Conversa vai, conversa vem acabei contando sobre a viagem e também sobre o hogar, onde ficaria hospedado. Marcela me contou que há um estudo recente dentro da psiquiatria, no campo das relacoes entre pais e filhos, que pode ser revolucionário. Há criancas classificadas pelos cientistas como Resistentes (indivíduos "LL"), Medianamente Resistentes (Ls) e Vulneráveis (ss). Criancas de genótipo "ss" podem desenvolver hiperatividade, tornando-se estressadas e imunologicamente debilitadas, o que causa cansaco fisico e mental, alem de facilitar o desenvolvimento de doencas.
Desobriu-se entao que o amor e o carinho de uma mae, ou de alguma pessoa que desempenhe o papel de mae, pode "promover" individuos de genótipo vulnerável (ss) a individuos medianamente resistentes (Ls). Isso mesmo: o afeto materno durante a infancia causa alteracoes geneticas! Desta forma, quando se dá carinho e protecao para criancas como estas do hogar, pode-se alterar o futuro de toda uma geraçao, pois um individuo vulnerável que se torna resistente vai passar os genes da resistencia para seus filhos, para os filhos de seus filhos, e assim por diante.

Esse embasamento científico pode nos dar a dimensao e a importancia de trabalhos como o de Carolina. Nao se trata de vida nova para apenas 12 criancas, mas sim para geracoes e geracoes. Cary pode nem desconfiar, mas esta mudando para melhor esta pequena parcela do mundo. Depois de ver jovens e velhos com camisetas de Che Guevara, após tantos anos insistindo em acreditar na revolucao armada, os niños do hogar me ensinam que é possivel mudar nosso mundo de outra forma.

A arma é simples e o custo é zero: Amor

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Obs: estou com dificuldades na acentuacao de palavras, pois o teclado chileno nao possui cedilha, til e alguns outros acentos muito utilizados na lingua portuguesa. Tenho que descobrir os codigos para poder usa-los.